segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Os preguiçosos, os mal-amados e os incompetentes

Chaplin em "O grande ditador". Hoje o que tem de
"pequenos ditadores soltos por aí, hein?"
Se Deus resolvesse, num dia de ócio no infinito, vir conversar comigo, e perguntasse a mim qual tipo de gente eu gostaria de excluir da Terra, eu ficaria em dúvida. Os preguiçosos? Os mal-amados? Os incompetentes? Realmente o páreo é duro. Aí estão três características que eu simplesmente ODEIO em alguém. Gente que fica pelos cantos, resmungando da vida, reclamando de tudo, apontando o dedo para todos. Tenho lá minhas sérias dúvidas se realmente esse povo sabe o que é ser feliz e ter consciência do que faz.

Os tempos andam estranhos cá para esses lados, e acho que de alguma janela Deus está espiando tudo. É um tal de criticar por criticar, apropriar-se da verdade e sair "falando o que pensa" que não cabe numa Bíblia. A internet virou um pandemônio de ditadores de regras e não há mais espaço para quem duvida ou quem pensa diferente. Vermelho é vermelho, azul é azul, e dane-se o amarelo, o cinza ou o rosa.

Tenho lido, com certa dose de indignação, postagens de um Mala-sem-alça que nunca exerceu a profissão para a qual estudou, mas se acha "o" guru da área. Não basta criticar; o bam-bam-bam tipo exportação personifica seus ataques. Ouse escrever algo que ele não concorde. Do conforto do sofá, sem pressão, com o bolso cheio de algum dinheiro de campanha eleitoral (sim, eu apurei isso, embora o sujeito esconda de seus "admiradores" o passado de 2010), ele vomita verdades e atrai seguidores. 

E a malinha sem alça continua por aí...
Nessa mesma história, causa-me pavor aquele tipo de gente que sabe o que tem que fazer, mas não faz pelo simples motivo de "não sou obrigado". Funciona à base de e-mails enviados, com explicações tintim-por-tintim e, se o telefone tocar fora do horário comercial, acha que pode destratar os outros ou simplesmente afirmar que "resolve na segunda-feira". É capaz de preferir gastar o tempo lixando unhas e lendo revista TiTiTi de cinco meses atrás a se informar e agir com retidão, com alguma boa-vontade.

Juntando essas duas espécies não raras, chego ao terceiro grupo que eu gostaria de ver extinto. Aquela gente (e aí não estou falando só de profissões, sabe?) que só sabe olhar de canto de olho, torcer a boca, levantar a sobrancelha e apontar defeitos nos outros. Variam da voz de taquara rachada à unha malfeita da vítima, passando pela desaprovação do novo namorado, do velho marido, dos amigos próximos. Tudo é só defeito. Mas ela (a criatura com poder máximo de avaliação) sempre está por cima, intocada. Nunca se envolve. Aposto que você, caro leitor, conhece alguém assim.

Ah, se Deus viesse bater um papo comigo. Eu daria umas sugestões bem legais a ele. Pediria, também, que me modificasse e me tornasse um pouco menos observador, um pouco menos passível dessas indignações. Queria simplesmente ver essas pessoas e deixá-las ir, seguindo seus caminhos. Mas elas teimam em atravessar o meu... e como Deus não veio ao meu encontro (melhor assim), tenho que conviver com elas, ainda que com insuperável fadiga.

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Hora de desconectar

Há três semanas assumi nova função no trabalho. Realizei um sonho, para o qual busquei me preparar, assumindo a coluna Praça Oito - o mais tradicional espaço de análise política do Espírito Santo. Uma responsabilidade gigante. Um desafio sem condições de ser medido. Desde então, sinto-me desafiado, todos os dias, a entender novos caminhos da política, a ponderar mais as palavras e - por que não admitir? - repensar minha própria conduta on-line.

Desde o dia em que fui convidado para o cargo, pela competente editora-executiva Andréia Lopes, que fez história como colunista da P8, e pela editora de Política de A GAZETA, Elisa Rangel, venho pensando em passar um tempo fora das redes sociais. Dei, de início, uma "limpeza" no Facebook e no Twitter, passei a pensar três, quatro vezes antes de postar minhas opiniões (via de regra, polêmicas...). Sei que muita gente não conseguirá diferir, de agora em diante, o Eduardo Fachetti colunista, jornalista, que carrega o crachá de A GAZETA no peito, do Eduardo neto da Vovó Santa, primo da Larissa, da Pollyanna, da Roberta, da Daniella, da Fernanda; do Eduardo que é "Dindudu" da Nicole e "tio Dudu" da Mel, da Clara e da Helena, amigo da Loreny, da Valeska e do Fábio.

Nos últimos dias, a vontade de "dar um tempo" no Facebook cresceu. Sobretudo porque vi, de gente que eu tinha em alta conta, comentários rancorosos, estranhos, a respeito de algumas coisas que escrevi. Não se tratava de uma fonte aborrecida por uma interpretação minha sobre determinado assunto: com isso lido tranquilamente e me cobro muito em sempre ouvir os dois, três, quatro lados da mesma história, para condensar tudo em uma análise o mais plural possível. Era comentário de gente "raivosa", recalcada, incomodada, afim de usar a internet para jogar indiretas e fazer sugestões indecorosas.

Isso não deveria me incomodar, eu sei. Alguns amigos, com os quais dividi esse meu sentimento, me disseram "deixa para lá", "toca a vida", "segue adiante". Mas é triste perceber que a mesma pessoa que há poucos meses me procurava para dizer "torço pelo seu sucesso" e "você vai longe" agora me classifica como "antiético", "antiprofissional", "Judas" . Ou, ainda, que aquele profissional (?) que me ligou, dias atrás, pedindo "pelo amor de Deus, dê uma notinha minha, porque meu emprego tá em risco" agora faz comentários desmerecendo o mesmo espaço pelo qual lutava para emplacar uma informação. 

Tenho segurança daquilo que escrevo. Não sou um ancião do jornalismo, não tenho décadas de formado, mas tenho noção  do que minha função representa para os leitores. Não escrevo a meu bel-prazer, nem para defender fulano ou sicrano. Por isso busco, diariamente, orientação com quem está acima de mim na hierarquia da Redação; para que não impere só a minha visão, para que novos caminhos e ângulos informativos me sejam apontados. Dialogar é algo que me faz bem. Gosto de falar e de ouvir e adoro quem sabe argumentar.

Quanto às redes sociais, são um ótimo canal para obter informações, para me atualizar e manter contato com amigos e familiares que estão longe. Estou ciente de que o Eduardo colunista e o Eduardo cidadão (que vai a festas, visita a família, caminha na praia, faz careta com as sobrinhas, anda de ônibus) andarão lado a lado, inseparáveis. Essas duas facetas de mim têm que aprender a conviver.

Mas não estou disposto a deixar que o Eduardo neto-primo-sobrinho-amigo-tio-padrinho sofra pelas críticas que o colunista terá que administrar. Por isso, decidi ficar uns dias fora do Facebook e do Twitter. Pensar na vida, viver "offline", tentar encontrar um meio-termo. Vai ser bom para mim e para meus amigos/seguidores. Não vou abandonar minhas contas por lá. Quem me conhece sabe que gosto - e até demais! - da tal de timeline. 

Os meus amigos sabem meus telefones pessoais. Minha família sabe como me encontrar. Quem está no meu Facebook ou no meu Twitter em busca do colunista pode comprar o jornal para ter acesso aos meus canais profissionais. Então, ninguém há de sair perdendo. O mundo dá voltas, e eu vou dar uma volta. No retorno, pretendo não dar mais espaço a gente de energia baixa e caráter zero.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Receita de namorado perfeito

Quando menina, Marieta queria ser grande. Brincava com as bonecas Barbie da prima Nathália imaginando que aquela beleza loura e magra um dia seria sua. Vislumbrava, em seus devaneios inocentes, aquele carro cor de rosa, o guarda-roupa cheio de penduricalhos, um mundo perfeito e um namorado tal qual Ken, com ombros largos, braços fortes e sorriso branco Colgate.

Marieta não queria ir à escola; queria ser executiva de uma grande empresa, comandar um exército de funcionários, ter sua própria mesa com livros, anotações, grampeador e cadeira giratória. Na falta de idade para ter tudo isso, ia à sala de aula imaginando-se numa grande companhia - e, vez ou outra, tratava os coleguinhas como se seus vassalos fossem.

Na adolescência, não quis conhecer rapazes. Recusou-se a ir a boates, a beber com as amigas aos 13 anos, a usar meião branco até os joelhos, a cachear os longos fios dourados com babyliss, quando isso era moda. Tudo isso iria torná-la igual às demais. Mas Marieta sabia - embora ninguém a tenha dito isso - que era singular, única. Um exemplo a ser notado pelos garotos que, àquela altura da vida, cobiçavam as meninas muito mais por suas curvas que por suas qualidades intelectuais.

Chegado o Ensino Médio, e com ele a ebulição hormonal, Marieta, por fim, apaixonou-se. Bastava sentir o perfume de Paulo, o garoto mais bonito e popular da turma, e seu coração acelerava. Admirava o jeito com que ele assoprava a franja que teimava em cair sobre os olhos, estremecia ao ver aquele par de coxas fortes em atividade, no campo de futebol, derretia-se com as idiotices que ele dizia. Afinal, tinham 17 anos. Ele assumia a fama de Don Juan, ela, sempre tão perfeita, preferia ser estudiosa e não admitia seus sonhos.

Os anos se passaram e Marieta continuou olhando para si. Para seu umbigo, para seus resultados, para suas conquistas. Era ela. Ela e ela. E, na mente, a esperança de que aquele rapaz forte, de braços torneados, ombros largos, sorriso branco, cabelo ligeiramente despenteado, voz rouca, unhas bem cortadas, pelos aparados, desenvolto em inglês, espanhol, francês, com carimbos no passaporte e disposição para ouvi-la falar da vida e do quanto lutou para ser o que é, chegasse.

O Ken não apareceu. Marieta amadureceu. Chegou à casa dos 30 sozinha. Cheia de conquistas profissionais. Uma infinidade de diplomas e certificados na parede. Sabia falar a língua dos latinos e a dos norte-americanos. Era bonita, embora não tivesse o corpo escultural das dançarinas do Faustão. Mas, ora, ela tinha atributos encantadores. "Melhor sozinha do que com qualquer um", resmungava com sua própria consciência, quando esta lhe apontava a solidão como preço pago.

Numa bela tarde de outono, com certa amargura no coração e nó na garganta, ela sentou-se à sombra de uma árvore, numa praça qualquer, de uma cidade não muito distante da nossa. Chorou em público, pela primeira vez. Esqueceu-se, por alguns minutos, da Marieta construída ao longo de mais de três décadas. Ali estava apenas uma mulher. Frágil, insegura, com medo. Medo dela. Do que não conheceu. Triste pelo que não viveu. As lágrimas rolaram, molharam o chão, secaram.

Marieta levantou-se. Respirou fundo, ergueu a cabeça. "Chega!", disse para si mesma. Apanhou, na bolsa que repousava ao seu lado, um bloco, e nele começou a enumerar tudo o que passou a vida somando ao seu Ken imaginário. Delicadeza, mas não feminilidade, bom gosto para música, roupas de boa procedência, perfume marcante, pés bonitos, dedos das mãos longos, olhar expressivo, conteúdo para mais de duas horas ininterruptas de conversa, bom humor matinal, romantismo sem excesso ou dependência. 

Estava de bom tamanho. Em algum lugar esse homem deveria estar. Marieta levantou-se, e novamente convencida de que estava no rumo certo, seguiu seu rumo. Sozinha.

terça-feira, 4 de junho de 2013

Nem tudo é sexo

O que faz duas pessoas estarem juntas, serem cúmplices, estarem disponíveis uma para a outra? Mãos dadas, brilho nos olhos, objetivos afins. Toque, ternura. Brigas - sim, brigas! - para uma conciliação posterior. Tudo isso e mais um pouco, creio. E, no "mais um pouco" cabe um caminhão de emoções e confusões.

Para duas pessoas estarem juntas é preciso, antes de tudo, que queiram estar juntas. Foi-se o tempo do casamento arranjado, do namoro no sofá, das amizades por interesses inconfessáveis. Findou-se a época das submissões, da mentira, do gozo fingido para agradar o marido ou da virilidade forçada para não explicitar os desejos íntimos e controversos.

Estar junto exige renúncia. Há de ser pensar que doravante nos tornamos um, mas que esse um ao mesmo tempo é dois - e nem sempre concordantes! Se conjugamos a vida na primeira pessoa do plural, temos que encontrar convergências e, vez ou outra, ir pelo caminho que o outro quer, de mãos dadas. Pizza ou salada de alface? Prefiro massa, mas posso ceder à folhagem se isso me der em retribuição seu sorriso inocente com um verdinho no dente.

Assumir o "nós" exige palavras medidas. Estendo ao máximo a corda que segura a língua ferina, para não lhe desagradar revelando que essa calça não combina ou que sua barriga não está tão sequinha quanto a camisa justa possa suportar. Ao mesmo tempo, finjo não perceber seu deboche implícito e sua reprovação às minhas cantorias no chuveiro.

Optar por uma vida não egocêntrica requer paciência. Para tolerar as horas a mais no trabalho que te impedem de ir ao cinema, para suportar as horas de sol à espera do ônibus para cruzar a cidade e roubar um beijo. Paciência para que o "hoje não" ou o "aí não pode" não virem crises. Paciência para observar um sono infinito nas manhãs que poderiam ser divertidas.

Para duas pessoas estarem juntas é preciso, talvez, que estejam separadas. Que, por estarem longes, reconheçam a falta que uma faz à outra. Que sorriam estando distantes, só por alguma lembrança boba. E, junto de todos esses motivos, acrescento um derradeiro: que a união não seja só sinônimo de sexo. É preciso saber tocar, esperar e entrar pela porta do coração. 


segunda-feira, 22 de abril de 2013

Almas sem lacre

Gosto de imaginar que, dentro de cada um de nós, há um depósito. Um depósito imenso, desses que comportam contêineres, caixas e um amontoado de bagulhos. Coisas que a gente vai recolhendo por onde passa - tipo fotos do verão passado, souvenirs de viagens inesquecíveis, cartas a serem guardadas. 

Eu tenho meu depósito interior, e creio que, aí do outro lado da tela, também haja outro. Talvez você, caro leitor, nunca o tenha vasculhado, mas que ele está lá, está. É aquele cantinho da gente - e só da gente - onde ficam escondidinhas certas emoções. Recordações de fins de semana deliciosos ao lado de amigos, risos escancarados causados por anedotas ouvidas, aquele perfume que te remete com exatidão a uma cena vivida. Cabe tudo dentro de nós!

E, nesse depósito da alma estão também as caixas de pertences em desuso. Como se fossem caixas de mudança, sabe? De papelão, grandes, quadradas, com as tampas lacradas com fita crepe. Caixas de sentimentos que nem sempre revisitamos. Ora por medo, ora por respeito ao que passou. Está lá, em uma dessas caixas empoeiradas, aquela manhã de sábado em que mamãe morreu. Não mexo também nas poucas lembranças que tenho do meu pai. Evito dispersar a poeira que paira sobre a caixa das dores e doenças do passado. Deixo tudo lá, quietinho. Mas sei que existe.

Nessa imensidão de guardados, certamente eu, você, nosso vizinho do lado, todos nós temos uma caixa de beijos gostosos que ficaram para trás. De gente querida a quem demos as mãos, de amores saborosos que não vingaram. E a vida, apressada que só, vai jogando outras toneladas de guardados sobre tudo isso - contas a pagar, emprego, mercado financeiro, o preço do pão de sal, o nascimento das crianças, o casamento da melhor amiga, o desânimo com o trabalho... ufa! É muita caixa para um espaço gigante e ao mesmo tempo ínfimo, visto que está dentro do peito.

Mas, calma aí... olhando direitinho, com atenção, nem tudo está lacrado. Como aqueles velhos álbuns de fotografia empilhados sobre o guarda-roupa, há caixas de sentimentos que estão entreabertas. Olhe bem... e de novo. Lá no cantinho, naquele espaço escuro que você parece não perceber existe uma caixa aberta. Ela está cheia de planos que você fez e não teve a audácia de correr atrás. Tem beijos memoráveis da juventude, tem gosto de broa de fubá, carinhos e olhares daquela tia que mora longe, tem histórias com começo, meio e... sem fim.

No fundo, no fundo da alma, todos nós temos caixas mal fechadas remetendo a de tudo um pouco. Tem amor não resolvido, brigas não esclarecidas, mágoas escondidas (na base do "vou deixar passar dessa vez..."), desaforos engolidos, palavras não ditas que, como nós atados, foram jogadas lá no fundo, para serem esquecidas. E nunca serão. Quanto mais vivo, mais certeza tenho de que certas caixas da alma jamais serão fechadas.

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Seja feliz, Feliciano!

Minha prima Larissa diria que eu não dispenso um "bafuê" ou algo do tipo, que seja sinônimo de "estar sempre em confusão ou gostando de pelejas". Não sei bem se é assim, mas aqui vou eu. Não estou nem aí para o tal Marco Feliciano! Pouco me importa o preço do tomate. Simples assim. 

E sabem por que? Porque Feliciano é um infeliz querendo aparecer. Demorei a escrever isso por um pouco de preguiça - ou, ainda, porque acho isso tão, mas tão óbvio, que me parece que todos deveriam percebê-lo. Minha gente, um homem que diz a uma revista de circulação nacional que, quando crespo, "era um monstrinho", que faz chapinha e redesenha a sobrancelha, e que brada aos quatro ventos ódio por negros e gays, só pode ser o que? In-fe-liz.

Infeliz pelas palavras, infeliz por ser quem é. Como disse a Dilma do humorista Gustavo Mendes: "- Tira seu cabelo do armário, Feliciânus!". Acho que isso falta ao nobre parlamentar da língua ferina. Saber quem é, gostar de quem é, para depois ir olhar para o (perdoem-me a falta de sutileza) rabo dos outros. Por isso, caros, não estou nem aí para ele. Enquanto diz bravatas para despertar a ira das minorias, Feliciano chora, trancado no banheiro, com pinça na mão, enquanto a monocelha se anuncia e a raiz cacheadinha grita no espelho.

Quanto aos tomates... estão caros? Valem mais que a barra de ouro do Silvio Santos? Merecem virar colar no colo de Ana Maria Braga? Ótimo! Vamos comer salada de alface. Para incrementar, vale uma lata de palmito em conserva, um bom azeite e, se o paladar pedir, alguma outra folhagem verde mais em conta. Desde quando tomate é essencial para a vida? Até ontem eu não sabia que ele era tão extraordinariamente necessário aos brasileiros. Vamos parar de show e comprar algo mais barato. Um dia o preço cai.

Os ônibus lotados, o desuso de desodorante por quem usa o transporte público, a sujeira nas ruas, a hipocrisia dos políticos, os baixos salários, os problemas de saúde, o preço dos remédios, a queda de cabelo, os quilos a mais e as calças jeans que não abotoam mais vêm à frente do armário do deputado e da banca da feira na lista de motivos que me tiram o sono e o bom humor. Então, seja feliz, Feliciano. E entupa-se de tomates!

quarta-feira, 27 de março de 2013

Quem nunca?

Qual de nós nunca guardou no peito um choro não chorado? Seja o choro da dor do dedinho do pé topado na quina do sofá, sejam as lágrimas de um amor mal acabado? Qual de nós nunca calou segredos, daqueles que nem ao travesseiro se confessa, ou que não perdeu a coragem de dizer a verdade quando queria  berrá-la?

Quem aí, por esse mundão que Deus fez, não esqueceu a letra da música preferida e cantarolou baixinho versos desconexos? Duvideodó que inexista sujeito que nunca amou errado - ou demais, ou de menos - mas que permaneceu inerte porque "ah, antes isso a ficar sozinho". Qual de nós nunca sonhou com o amor para sempre e perdeu uns meses (ou anos até) esperando-o chegar embalado de presente?

Quem, digam-me vocês, nunca encontrou alguém na rua, e esse alguém puxou conversa mas sabe-se lá quem é esse sujeito? O que fazer? Perguntar " - Ah, você é o primo de Nininha?" jogando na sorte ou insistir num assunto superficial para forçar a memória a reagir? Ah, entendidos da vida, digam-me que nunca passaram por isso...

Qual de nós jamais acordou, numa noite fria de inverno, com vontade de fazer xixi mas cedeu à maciez do edredon e, quietinho ficou até adormecer novamente? Me apontem uma pessoa que nunca se envergonhou da roupa suada em uma tarde escaldante de um verão qualquer - aquelas malditas "pizzas" debaixo do braço. Inferno! 

Quem nunca pensou em voltar com aquele ex-namorado? Que não se emocionou ao reler agendas velhas dos tempos de escola? Que nunca preencheu aqueles formulários pueris com perguntas "muito adultas" do tipo "- Você é BV?". Qual de nós nunca se pegou sorrindo ao relembrar do passado - daquela música gostosa que tocou no verão, daquele primo de longe que era o mais querido, da turma da infância que tocava a campainha do vizinho e saía correndo. Quem nunca?

Mas se você, meu caro visitante, se enquadrar em mais que sete dessas situações por nunca tê-las sentido, não se preocupe. Clique naquele xis lá no canto superior direito da página. Ainda é tempo de tentar. Porque talvez, até aqui, você não tenha vivido.

sexta-feira, 15 de março de 2013

Não me deixem ser o último!

"O único pesar é que o meu caderno de endereços de amigos está emagrecendo. O passar do tempo tem isso, você vai perdendo muita gente". A frase encerra uma entrevista do octogenário Manoel Carlos, um dos mais notáveis autores da TV Globo, anunciando sua próxima novela, a estrear em janeiro de 2014, e comentando as desvantagens do passar dos anos. Acabo de lê-la.

Estou cansado. Tive um dia de muitas pautas e, confesso a vocês, caros leitores, essas duas primeiras semanas pós-férias estão bastante puxadas. Cheguei em casa com olhos cansados, pés doendo e uma vontade absurda de me jogar na cama e abraçar o travesseiro. Mas Manoel Carlos conseguiu me despertar o desejo de escrever (além das três matérias de hoje...)

Mas escrever o que? Simples: não me deixem ser o último. Não sou pessoa que lida bem com a dor, com as perdas. Se vou a uma festa, ou a um encontro de amigos, tenho duas alternativas: sair com um breve abraço, evitando estardalhaço, ou ser o último a sair. Essa coisa de "tchau", "adeus", "boa viagem", mexe comigo. Lá no fundo, sempre penso "- Quando vai ser a próxima?".

Pensar na finitude da vida - sobretudo para mim, tão próximo da realidade, dores e dificuldades da Vovó Santa, do alto de seus 83 anos - é doloroso. Muitos primos da vovó já se foram. Alguns cheguei a conhecer, outros só sei das histórias da juventude. Álvaro, Aroldo, Anir, Lalá, Edith... nomes que vovó pronuncia com desenvoltura, com aquele gostinho de lembrança de uma época que foi boa - o que, se não foi, ao menos foi melhor que a atual.

De amigos, vovó pouco fala. Acho que ter seis filhos - o primeiro deles, aos 17 anos - e não ter estudado durante muitos anos contribuiu para uma vida sem esses laços. Mas vez ou outra, volta o relato dos tempos de menina, em que Vovó Santa caminhava de braços dados com Dona Hilária Rossi, hoje figura importante de Colatina, voltando da aula de datilografia que fizeram. Refaço a cena no meu imaginário... é simples, mas doce. Vovó me conta com ternura.

Ver os amigos partirem, ou simplesmente se distanciarem, não deve ser fácil. Como Maneco, o autor da Globo, quantos nomes o caderno de endereços da vovó já perdeu? Não sei. Peço a Deus, contudo, que me deixe com meu caderninho em paz. Em dia. Não cheio, porque não sou dos mais dados a inúmeros amigos (perdão, rei Roberto Carlos, não tenho sua ambição...), mas com as folhas daqueles que amo preservadas, intactas.

E, caso o destino decida desatualizar meu endereço e meus contatos na agenda dos meus amigos, daqui um dia, dois, semanas, anos até, quero que se lembrem de mim como um cara que os amou. Não um Eduardo linear e fácil de lidar, nem o Eduardo mais animado para festas de raiar o dia, nada disso. Não sou esse personagem 100% gente boa, eu sei bem. 

Mas, caros amigos, não se esqueçam de que, de um jeito torto, meio mandão, meio debochado, talvez irônico em demasia ou até mesmo carente demais, eu caprichei na letra ao incluí-los no meu caderno. E as folhas, acreditem, guardei na alma para nunca perder. Por isso, não se mudem para onde eu não possa estar junto. Não me deixem ser o último.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Francisco, o humano

Dizem que sobre religião e futebol não se discute, mas aqui vou eu. A tarde desta quarta-feira, 13 de março de 2013, o mundo parou para conhecer a face de um novo Papa. Católicos, evangélicos, espíritas... todos, por um motivo ou outro, tinham um mínimo de curiosidade quanto ao sucessor de Bento XVI, o Papa Emérito que renunciou ao trono de São Pedro. Eram pouco mais de 17 horas quando, da sacada da Basílica, no coração do Vaticano, anunciou-se Francisco.

O novo Papa, nascido na Argentina com o nome de Jorge, assume uma instituição embaçada por densas névoas. Denúncias de corrupção, guerra de poder, pedofilia e até uma espécie de "gueto gay" nos bastidores do catolicismo se transformaram numa espécie de fumaça negra que não cessa. Há quem diga que Bento sucumbiu a isso e, já idoso, entregou o Anel do Pescador por já não ter forças para combater o mal entranhado em seu rebanho. É suposição.

Mas, deixando a história e confabulações de lado, voltemos a Francisco. O homem que, segundo já conta o noticiário, cozinha a própria comida, anda de ônibus e ama os desvalidos é, acima de Papa... homem. Homem de carne e osso. Homem que tem medo. Homem que tem sonhos. Como qualquer outro, tem indisposições, tem hormônios, provavelmente tenha manias. Deve ter seus momentos de raiva, de "saco cheio", de preferir o silêncio ao badalar dos sinos.

O que será que se passou na cabeça de Jorge, o homem imperfeito, naquele meio tempo entre o expelir da fumaça branca na chaminé da Capela Sistina e sua revelação ao mundo, já rebatizado? "- Putz, e agora?". "- Senhor, dai-me forças". "- Será que dou conta de tudo isso?". Não me surpreenderia se qualquer uma dessas opções fosse a real. Talvez até seja. 

Fato é que o Papa não é Deus. Ele é, pela tradição católica, o elo entre o Todo-Poderoso e a humanidade; uma espécie de pai para a nação que comunga da paixão, morte e ressurreição de Cristo. E um elo, sabe-se, pode ser forte e duradouro como foi o beato João Paulo II, com seu carisma incontestável, ou frágil e dado à ruptura como foi Bento XVI, o homem-Papa que, com sua renúncia, alertou à humanidade de que ser o chefe da Igreja Católica não significa ser imaterial. 

Aliás, quero fazer um parêntese: Bento XVI nunca me foi muito caro. Não tinha o semblante de "bom senhor" que meu imaginário exige para um Papa, nem conseguiu, em seu pontificado, fazer algo tão grandioso que me chamasse a atenção ou revolvesse minha fé (bastante abalada, confesso). Mas sua renúncia me despertou ternura. Ali, ao admitir que estava cansado, o emérito mandatário católico cresceu na minha admiração. Saiu para a clausura com dignidade.

Agora Francisco tem a tarefa de recolher o rebanho de Pedro e dar a ele um rumo. Começou bem, ao curvar-se perante a multidão e, antes mesmo de abençoar os fiéis, pedir a eles, ao seu povo, bênção. Aos meus olhos, este foi mais um sinal claro e evidente de humanização da igreja. Não mais toda-poderosa. Não mais onipresente, onipotente e onisciente. Agora uma igreja santa e pecadora, como diz certa liturgia, em busca da remissão de seus pecados.

***

Só pra não deixar passar em branco o item "futebol" nessa discussão papal: talvez o maior pecado de Francisco tenha sido nascer argentino. Pai, perdoa-o!

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Música, amor e misérias

O amor regenera e mostra caminhos que não podíamos supor antes de conhecê-lo. Foi esta a conclusão à qual cheguei, na última segunda-feira, após mais de duas horas de fascínio em frente à tela de cinema, assistindo ao musical "Os Miseráveis". Se crítico eu fosse, descreveria como "Arrebatador. Forte. Esplendoroso".

Mas, não, não vou fazer uma crítica do filme, muito embora a história do escravo Jean Valjean e da operária Fantine mereça toda reverência. Antes, devo admitir que até chegar àquela sala de cinema, tudo que eu sabia sobre a obra era: "- Tem a música da Susan Boyle e ganhou três Oscar". Podem atirar as pedras os que bebem na fonte da sétima arte.

O filme vai além de um musical. Transpassa a melodia que tornou a britânica de cabelos desgrenhados famosa em todo o mundo. "Os Miseráveis" conta, com música - e muita música, até um pouco demais... - histórias de amores que se misturam. O amor entre jovens, de mãe para filha, de um homem para consigo próprio. O amor pelo país, por um ideal. A paixão juvenil pelas mudanças. Os ideais de vida que vão mudando com o passar dos anos.

O que levaria um ex-escravo a libertar da morte seu inimigo? Por qual motivo um jovem rico larga tudo e assume o risco de envergonhar a família? Se não por amor, que outro motivo pode levar alguém a reinventar-se para viver? Claro, excluindo-se as referências da narrativa do século XVIII, tudo isso ainda é muito pertinente e atual, a meu ver.

Você, caro leitor, quantas vezes já engoliu a seco uma resposta que gostaria de dar para não dar seguimento a uma briga? Quem aqui nunca assumiu uma desavença para defender alguém? E, ah... não é difícil encontrar quem confesse um amor não correspondido que, abafado no peito, trouxe nós de choro à garganta e amargor à alma.

Por esse Brasilzão de meu Deus, quantas mães deixam de comer para dar o último pão aos filhos? Quantas outras meninas, ainda tão jovens, não se vendem a preço de banana para sustentar a casa? Pais de família submetem-se a empregos degradantes, adolescentes isolam-se em suas bolhas de imaginações e fantasias para sonhar com quem amam.

Amores mal vividos podem levar o espírito ao deserto. Quem ama errado - às vezes até achando que está certo - pode se destruir e arruinar tudo ao redor. Mas esse sentimento, com seus efeitos colaterais, também é capaz de tirar uma alma infeliz do precipício, de fazer emergir do oceano da tristeza quem mergulhou na escuridão por desamor.

Amor não escolhe hora. Não escolhe cor. Não chega com endereço marcado nem se compromete a trajar os melhores tecidos. Amor nos faz enxergar a vida mais bonita e enche de sol os caminhos que vemos adiante, mesmo em dias de tempestade. É sentimento que põe música nos pensamentos e sorrisos fugitivos do canto da boca. O amor não tem miséria. Miseráveis são os que nunca amaram.

sábado, 23 de fevereiro de 2013

Quem disse que era fácil?

No início, tudo era simples. A de abelha, E de escova, I de índio, O de óculos, U de urso. Vieram as sílabas. As palavras. Depois fomos apresentados aos números. "Arme e efetue", escrevia a professora dos primeiros anos do Ensino Fundamental, para nos ensinar as primeiras operações. Era o sinal de que as coisas não seriam somente be-a-bá.

Houve o tempo das multiplicações, das divisões. Da escolha do turno da escola, quando metade dos colegas ficou pela manhã e a outra metade se transferiu para a tarde. Amizades rompidas, novos hábitos. Mudança de escola, de cidade. A primeira aula de inglês? Novo idioma! Como é que eu iria saber que "- What is your name?", esse emaranhado de sons que me obrigava a enrolar a língua, significava um simples "- Como é seu nome?", que eu já dizia sem problema algum há anos?

Ninguém me avisou que para engordar bastava comer desenfreadamente, mas que emagrecer seria bastante complicado. Logo eu, que era chamado de "Macarrão" pelo meu pai, tal a grossura das minhas canelas, no florescer da adolescência virei um verdadeiro bujão de gás. Também não foi fácil passar pelos 13, 14, 15 anos, quando meus amigos já estavam crescendo, e eu ficando para trás. Quantas interrogações na cabeça!

A fase do Ensino Médio, lidar com novas disciplinas. Química? Física? Que diabos eu vou fazer com os gases nobres? Para que eu tenho que entender de força centrípeda? E aquelas fórmulas imensas que não levavam a nada? De nada valeram as notas 10 em português, literatura. Para que estudei para aprender História, Inglês, Desenho Técnico? Onde eu ia bem não era o foco da escola. Acabei jubilado por nunca ter aceito a lógica das exatas.

Veio a faculdade. A primeira desilusão amorosa. O primeiro namoro estável. Novas dúvidas, outros medos. Contas a pagar, estágios, responsabilidades. Cobranças, timbre de voz para entrar na rádio, ao vivo. Chegaram as primeiras faturas do cartão de crédito, a hora de ser contratado, os desafios profissionais, escolhas tendo que ser feitas a todo instante. Nenhum dia repetindo a rotina do anterior. Os amigos da infância noivando, se distanciando, viajando. Todos dando rumo à própria vida.

Ah... como era bom ser criança e passar os domingos sentado no tapete vermelho da sala da Dindinha Dica, lá em Colatina. Tempo de roubar bombom Serenata da despensa, de brincar de "múmia" na piscina com os primos, de colher as carambolas, jabuticabas e morangos que nasciam no quintal da minha casa. Mas não... naquela época eu não queria nada disso. Não queria só a piscina, pouco ligava para as frutas, não fazia questão de ser criança junto com os outros da minha idade.

Eu queria ser grande. Eu queria trabalhar. Eu queria ser adulto. Pois é... não dei ouvidos a nenhum daqueles que me disse: "- Aproveita agora, porque depois é diferente". Eu queria essa diferença. Só não me lembro de ninguém ter dito, às claras, que ser grande é difícil.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Partidas, chegadas, recomeços

Quando me despedi da redação, em 2009
"Uma pedra. O mar. A ilha. Abri a porta. A lua. O sol. O azul. Fechei a porta" - Não, esta não é a citação de nenhum verso famoso, nada que remeta a Clarice Lispector ou a Caio Fernando Abreu. É só uma piadinha interna que nasceu, meio como quem não quer nada, num desses domingos ensolarados de praia, enquanto eu e um grupo de pessoas queridas falávamos da vida, de pessoas, de partidas e mudanças.

Partidas... ah, elas me partem o coração. Já devo ter dito isso aqui algumas vezes, mas é incômoda demais para mim a sensação de uma despedida. Seja do até breve ao adeus, o que fica é um pequeno nó na garganta e um coração miudinho, miudinho. E hoje, lá na redação de A GAZETA, onde trabalho, foi dia de despedida. Bem... não propriamente uma despedida, e sim uma "passada de bastão". Andréia Lopes, minha chefe, segue outros rumos na empresa e, em seu lugar, assume Elisa Rangel, até então a "número dois" da Política no nosso jornal.

Não vou deixar de ver a Andréia, tampouco mudará meu jeito de fazer jornalismo. A equipe permanece a mesma e tenho ali grandes companheiros, amigos até. Então, cadê a despedida? Bem, talvez poucos saibam, mas a única vez que pedi emprego a alguém, foi à Andréia Lopes. 

Estou na Redação desde 2007, onde cheguei como estagiário da CBN Vitória, comandada, na época, pela querida "chefa" Luciane Ventura. Em 2009, minha trajetória por lá deu uma "pausa", quando findou-se meu contrato de estágio e tive uma rápida passagem (de nove meses) por assessoria de comunicação em uma prefeitura. Não era minha vocação e eu sofria por isso. Foi quando, numa tarde qualquer, mandei uma DM, via Twitter, para Andréia, pedindo: "- Me leva de volta?". Eu não tinha a menor intimidade com ela. Por que ela me daria emprego? Mas eu a admirava. Gostava de seus textos, lia as matérias da equipe que ela comandava e pensava: "- Se for para lidar com políticos, quero estar lá, e não aqui como assessor".

Comemoramos minha vitória em um prêmio, em 2011
Não havia vaga, Andréia não me deu o emprego em 2009, mas meses depois voltei para o hardnews, novamente a convite da Luciane, que me deu a primeira chance como repórter. Aprendi muito. Ganhei prêmio. Vivi coisas magníficas na CBN e isso formou muito do que sou profissionalmente hoje. Mas em 2011 meus olhos brilharam quando Andréia me convidou para ir para o jornal. Bateu ansiedade, frio na barriga, vontade de crescer, de me aprimorar. Me lancei e lá estou.

Andréia foi uma colunista brilhante em seus anos de Praça Oito (onde, aliás, hoje eu atuo como interino, com muito orgulho e felicidade!), e já disse isso a ela, certa vez: uma das primeiras lembranças que tenho de jornal é ver a foto dela no alto da coluna e de Sérgio Egito, seu marido, como titular da coluna Victor Hugo, na editoria de Cidades. Há quantos anos isso aconteceu? Não sei... mas me lembro das fotos.

Andréia foi, nesses 17 meses, um freio de arrumação na minha vida profissional. "- Isso é conduta de repórter de Política?", esbravejava ela, logo no começo, quando eu postava alguma patacoada nas redes sociais (hoje estou fazendo tudo tão direitinho... será?!). Em uma das primeiras pautas que tive, dei uma cochilada no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) e, no dia seguinte, minha matéria saiu toda errada. Gente, TO-DA errada. O que Andréia fez? Me chamou na mesa dela e, sem alterar a voz, saiu-se com essa: "- O que eu faço com você? Você me fez passar uma vergonha. Isso nunca aconteceu antes nessa equipe. Então, se vire, dê um jeito e eu quero um furo no concorrente amanhã. Mas não estou brigando, tá? É só um toque". Cara... teria sido melhor se ela tivesse brigado!

Do convívio diário, nasceu uma boa amizade
Não tomei só "um toque". Foram vários. E, de toque em toque, de dica em dica, eu fui caminhando para frente, enxergando leads mais fáceis, encontrando fontes, construindo laços, apurando, dando retornos, tendo ideias. Quando surgiu na pauta, pela primeira vez, "fazer a Praça Oito de segunda-feira", por ocasião de uma folga de Radanezi Amorim, o titular da coluna, meu coração disparou. Estaria eu preparado? A Andréia pirou? O que eu vou escrever? Ai meu Deus, tudo isso junto e ao mesmo tempo. Com paciência, ela me explicou, me deu dicas. Só faltou segurar minha mão para que eu desse aquele primeiro passo com alguma certeza, ainda que com a barriga gelada. Depois vieram outras colunas, períodos maiores de interinidade. Peguei gosto pela coisa, mas nunca me distanciei do apoio, das dicas, da orientação dela, que era (e continua sendo!) um grande exemplo pra mim.

Devo a Andréia muito do que conquistei nos últimos tempos. Ela não se restringiu a ser uma chefe metódica e disciplinadora. Foi amiga, foi ouvinte, me deu dicas e "toques" nas horas difíceis da minha vida fora do jornal. É bom que isso fique claro: com a Andréia, tive mais um exemplo concreto de que para ser chefe é preciso mais que saber mandar; é necessário ouvir, tentar equilibrar, sorrir quando houver graça e arquear a sobrancelha na hora em que o bicho pega. Ser chefe é ser gente, no mais amplo sentido que isso tenha.

Um brinde ao recomeço!
Hoje, lá na redação, a equipe se despediu da minha chefe Andréia. Eu, de férias, não participei. Vou deixar para vê-la, no exercício da nova função, quando voltar ao trabalho. Até lá, ela já estará habituada à nova rotina, Elisa, a nova editora, em pleno domínio da cadeira e eu, leve e motivado, para recomeçar as atividades neste 2013. Uma página foi virada. Mais um capítulo vai começar por lá.

Então, que sejam bem-vindas e abençoadas as mudanças. Me despeço da Andréia editora de Política, mas comemoro, vibro, faço festa e me felicito com a Andréia que fez uma verdadeira travessia na minha vida, a quem hoje eu chamo de amiga. Vamos em frente!

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Ah, Hugo!

A vida nos prega preças e reserva surpresas, sobre isso já escrevi tantas vezes. Mas sabe quando a surpresa é tanta - e tão assustadora e ao mesmo tempo gostosa - que te deixa rindo sozinho por um tempo? Pois é. Imagine, então, o que é reencontrar o primeiro melhor amigo, anos depois, e saber que ele não se esqueceu de você em duas décadas!

Os primeiros nove anos da minha vida eu passei em Laranjeiras, no município da Serra. Estudava na Escola Pequeno Príncipe. Lembro com clareza dos muros altos, chapiscados, da quadra de cimento grosso, da árvore que havia em frente à janela da minha sala de aula.

Fui alfabetizado pela "tia Ana", uma tia magrinha e risonha. Lembro-me da voz anasalada dela, contando-nos das aventuras da "Turma da Abelhinha" - o método de alfabetização vigente naquele início dos anos 90. Está na minha recordação a imagem do varal de roupas, em cima do quadro negro, com as gravuras de Abelhinha, Escovinha, Índio, Óculos, , Ursinho, Vagalume, Dália, Lobo, Minhoca,Pipa, Gato, Rato, Torre, Bule, Caracol, e tantos outros personagens que, a cada semana, chegavam para me ensinar a ler e a escrever. 

Na minha sala havia muitos colegas, e apesar da pouca idade, desde aquela época eu decorava nomes e sobrenomes. Havia a Juliana Neri, a Larissa Lyrio, a Monia Chieppe, O Raphael Schneider, o Rafael Batista... e o Hugo. O Hugo era meu melhor amigo. Daqueles que lanchava junto, que brincava no recreio, que dividia segredos. Hugo foi o único amigo que levei à minha casa para brincar num fim de semana - quando criança, eu vivia doente e, por isso, não era dado às brincadeiras na rua.

São claras a imagens que tenho das vezes em que eu e meu amigo lanchávamos, sentados no primeiro degrau da escada da escola. Éramos os mais altos da turma (sim, eu já fui alto!) e, por isso, os últimos da fila na hora do recreio. Com o Hugo eu fazia planos impossíveis, ria de bobeiras - a ponto de dar aquelas gargalhadas gostosas, da cabeça virar para trás e a barriga doer. 

Eu queria ser como o Hugo. Ele era baixinho, gordinho e tinha um cabelo caído na testa. Eu, magro com cabelo sempre penteado de lado. Eu achava que ser cheinho era vantagem (aí veio Deus, me fez tomar corticoide por anos e até hoje luto com a balança! Depois dizem que desejos de crianças não são ouvidos tsc tsc tsc). 

Quando Hugo foi na minha casa - o sobrado rosa que já descrevi aqui certa vez -, eu tive vergonha porque parte da fachada não tinha reboco e porque o muro era feio. Eu queria ter uma casa bonita para apresentar ao meu amigo. Passamos uma tarde brincando no quintal e, de sobremesa, Vovó Santa, sempre presente, nos serviu chantilly com raspas de limão. A gente não gostou rsrsrs

Mas, onde você quer chegar com tanto trololó, Eduardo? Bem, o Hugo reapareceu. De bobeira no Facebook, ontem resolvi jogar os nomes e sobrenomes dos coleguinhas da alfabetização. Achei a Larissa Lyrio, a Monia Chieppe... e o Hugo. Caramba! A infância voltou como um filme à minha cabeça - e eu acho que ele não mudou na-di-nha nesses quase 20 anos. A última vez que eu o havia visto foi em 1994, quando fui expulso da Escola Pequeno Príncipe por mal comportamento. 


Hugo respondeu minha mensagem no Facebook. Caramba, é ele mesmo! Começamos a teclar e, gente, meu antigo-melhor-amigo lembra de mim. Não só se lembra, como guarda até hoje a agenda que tinha na época, onde está o endereço da minha casa de Laranjeiras. O Hugo se lembrou da tarde que passamos brincando na minha casa. Em vez da fachada malfeita, se recordou de ter tomado suco de melancia pela primeira vez na vida (eu não me lembrava disso!). 

Meu antigo-melhor-amigo se lembrou que eu comia comida sem sal - caramba, às vezes até eu me esqueço desse capítulo da minha infância! - e de tantas brincadeiras daquela época boa. Disse que, já na primeira série, meus textos eram bons. Pausa para meu deboche costumeiro: desde quando "Eva viu a uva" e "A abelhinha olhou a escovinha" podem ser considerados textos? E bons? Ah, Hugo...

Ri sozinho. Me lembrei de momentos bons, de histórias que o tempo havia apagado da minha lembrança. E, mesmo que hoje Hugo não seja o meu melhor amigo, que a vida tenha me apresentado tantas outras pessoas nos últimos 19 anos, e que nada mais em comum haja entre nós, valeu a pena voltar a ser criança de novo. Uma lembrança com sabor de chantilly, raspas de limão, e frio na barriga com medo da "malvada" tia Bernadeth, a diretora da escola que interrompeu nossa amizade. É... 1994 foi "logo ali"...