quarta-feira, 30 de maio de 2012

Manias, manias

Tenho manias que são muito minhas. Como qualquer pessoa, reconheço em mim traços, virtudes e defeitos particulares, alguns até inconfessáveis. Alguns me irritam, outros nem tanto. Há dias em que sinto raiva de mim por ser do meu jeito, há dias em que rio de mim e me aceito do jeito que sou (o que me faço ser?).

Tenho mania de franzir a testa em frente ao espelho, pra ver onde a proximidade dos 30 anos já se anuncia. Marcas de expressão presentes, linhas que rasgam a testa. Ok, ok, não são tão evidentes e o "balzaquianismo" (existe isso?) ainda vai demorar três anos a chegar, mas essa mania está em mim. Ah, também gosto de ver até onde consigo arquear a sobrancelha - algo, aliás, que sem notar faço toda vez que algo me desagrada ou me desperta deboche.

Crio frases que me caracterizam por certo tempo. Foi assim em 2002, quando ao pular uma cadeira do auditório do CEFETES e ser advertido pelo professor, exclamei: "- Cruzes!!". Pronto, por um bom tempo, quando os outros alunos me viam nos corredores, repetiam a expressão. Em 2006, eu dizia sempre "- Ai que triste" diante de alguma notícia ou frase pesarosa, e até hoje minha tia Norminha assim se lembra de mim.

Ultimamente tenho repetido à exaustão a frase "- Palavras têm vida", quando me manifesto sobre as profecias que fazemos no dia a dia. É um alerta para ver se eu mesmo me atento de não dizer coisas negativas. Afinal, palavras têm vida e, Deus me livre, não quero nada de ruim por perto!

Tenho mania de passar xampu duas vezes durante o banho, de ler a última página de um livro antes de começar a leitura, de organizar as camisas por cor no guarda-roupas, de entrar com o pé direito em um ambiente desconhecido, de ficar navegando na internet toda vez que estou no ponto ou dentro de um ônibus (para evitar que alguém puxe papo).
 
Não suporto tela de celular suja. Se ao encostar o aparelho na bochecha para falar ele mancha, perco alguns segundos esfregando qualquer pedaço de pano para ver o display novamente nítido. Meu celular tem uma "portinha" para conexão USB que fecha e abre para encaixar o cabo, e vez ou outra, me pego num "abre-fecha-abre-fecha" instintivo, só para ouvir aquele barulhinho do encaixe da peça.

Um costume irritante é dizer "- Uhum" quando concordo com algo e "- Agradeço muitíssimo" quando encerro uma entrevista. Às vezes nem estou agradecendo coisa alguma, é verdade. Tenho mania de repensar cenas vividas e projetar finais diferentes para diálogos. De imaginar situações factíveis com início, meio e fim, a ponto de acreditar tanto nas minhas versões que, quando se tornam reais, prefiro o que criei.

Tenho a estranha mania - um vício, até - de percorrer com os olhos todos os cantos do rosto de uma pessoa enquanto estou conversando. Cultuo a mania de acreditar no ser humano, mas tendo no bolso meus "poréns" e defesas para uma rota de fuga. Mania besta, essa, de estar sempre em busca do que não consegui.

terça-feira, 22 de maio de 2012

Vida de novela

Seria mais fácil se a vida fosse como nas novelas: acordar penteado, com hálito fresco, ter a casa sempre arrumada, as toalhas de banho sempre bem dispostas, sair e entrar do serviço a hora que bem se entende e, nas adversidades, adiantar dias e meses de uma cena para a outra.

Viver seria mais simples se pudéssemos escolher os vilões e mocinhos com quem lidamos. Se tivéssemos a certeza da derradeira cena do acerto de contas. Seria bom poder quebrar a casa toda num acesso de fúria, com a certeza de que, passados 30 segundos, a casa estaria limpa e organizada novamente. 

Os casamentos seriam mais felizes se, como nas tramas, as pessoas reconhecessem suas almas gêmeas só por olhar. Se os casais se cruzassem nas ruas e o vento soprasse diferente para levar um ao outro amado; se as crianças viessem lindas e bochechudas - sem cocô na fralda, sem choro de madrugada, sem golfada no ombro. 

As cerimônias de enlace seriam perfeitas se, como nas fábulas televisivas, não envolvessem contas a pagar depois, muito estresse, salão de beleza lotado, frio na barriga, briga de familiares por saber quem será ou não padrinho. Desta forma, o Brasil seria recordista mundial de uniões e as igrejas não teriam datas livres até, sei lá, 2014. E os padres, claro, suariam menos se só precisassem dizer "- Se alguém tem alguma coisa contra esse casamento, fale agora ou cale-se para sempre" sob as pesadas vestimentas litúrgicas.

Seria mais fácil se a vida pudesse ser adiantada em capítulos. Se a sinopse pudesse ser conhecida e decorada. Se nossas reações às chamadas pudessem ser ensaiadas à exaustão, até a cena ficar perfeita. Os dias seriam menos angustiantes se houvesse a certeza de que no dia seguinte as pendências se resolveriam. Se os mocinhos, mesmo distantes, tivessem a clareza de que encontrariam as mocinhas; se os antagonistas tivessem punição garantida ao fim da trama.

A vida seria deliciosa se toda casa tivesse piscina sempre limpa, se as festas fossem cheias de gente bonita, se o espumante estivesse sempre gelado na medida certa. A alegria da vida seria contagiosa e definitiva se como nas novelas as doenças mais diversas tivessem cura sem tratamentos longos e penosos e se cada um de nós tivesse uma trilha sonora própria para embalar os momentos especiais.

Seria bom conhecer os planos que Deus, o autor oculto e silencioso, tem para seus personagens. E se assim não pode ser - já que estamos fadados a desencontros, a amores não correspondidos, a cabelos desalinhados, a contas a pagar no fim do mês e à eterna incerteza do amanhã - só nos resta, vilões e mocinhos, coadjuvantes e protagonistas, esperar pelas cenas dos próximos capítulos.

domingo, 20 de maio de 2012

Um eterno "E"

Numa rápida olhada aqui no "Fachettoides", percebi que por algumas vezes escrevi sobre a complementação de sentimentos: Tempo, pessoas e lembrançasCasas, pessoas e nossos cômodos, Mentiras & Renúncias, Dúvidas, exclamações e reticências, por exemplo. Agora há pouco, vi no Twitter uma postagem da jornalista e cronista Ana Laura Nahas sobre "Moacir Scliar e o sentido da vida". Texto leve, simples, direto, sobre essa busca que cada um de nós tem por respostas.

Conta Ana Laura que o escritor gaúcho pretendia, em vida, entender o que dá sentido à existência. Já me peguei diversas vezes com a mesma questão e devo ter falado disso uma dezena de vezes por aqui. Mas não é esse meu mote por agora. É dissecar justamente esse "e" que sempre colocamos no dia a dia. 

Sempre queremos entender "dúvidas e exclamações", "mentiras e renúncias", o certo e o errado, o bom e o mau. É um eterno mais, mais, mais, como se não bastasse uma única resposta. Aliás, na faculdade, fui ensinado a sempre deixar o silêncio do entrevistado constrangê-lo de alguma forma. "- Quando o entrevistado se calar, no meio de uma pergunta embaraçosa, fixe-o como se esperasse o 'e'", disse-me uma professora. Mal sabia ela que eu, desde que me entendo por gente, persigo o desconhecido.

Busco respostas (dos entrevistados e minhas) que me levem além. E (olha o "e" aí!) acho que essa mania não é só minha, visto que tenho vários conhecidos que estão sempre atrás daquilo que ainda não chegou ou não se expôs. A quinta letra do alfabeto, essa conjunção aditiva, surge intempestivamente para unir orações, palavras, para inibir pontos finais. Aliás, existe medo maior que o tal ponto final definitivo??

A religião ensina que a fé nos move. A terapia orienta que o autoconhecimento alavanca. O jornalismo disciplina a busca pelo inusitado. No fim das contas, seja por que via for, sempre estamos atrás do que não temos, de modo que o que já está conosco precisa ser complementado. Amor só é amor com fidelidade e proximidade e lealdade e confiança. Sucesso só é sucesso com estabilidade e prazer e crescimento e reconhecimento e dinheiro. 

Acho que estamos condenados, desde o nascimento, a ir atrás daquilo que não temos. Quando conseguimos (um relacionamento, um emprego, uma roupa ou carro novo), logo partimos para outro desejo e outro foco e um detalhe que seja. A vida é um eterno acrescer... para crescer.